Na série de entrevistas da Sociedade Numismática Brasileira (SNB), tivemos o prazer de conhecer mais de perto o trabalho do pesquisador e colecionador Leonardo Tupinambá, diretamente de São Luís do Maranhão. Com uma abordagem que une história, arqueologia, documentação e memória, Leonardo mostra como a numismática é uma poderosa ferramenta para compreender o Brasil — especialmente sua terra natal.
Leonardo iniciou sua jornada como muitos colecionadores: com selos. Mas logo as dificuldades de conservação no clima úmido de São Luís o levaram às moedas. O ponto de virada veio com um presente da mãe: moedas estrangeiras, de vários metais e cores.
“Aquilo me encantou. Era diferente da nossa moeda nacional, e despertou minha curiosidade.”
Daí em diante, o colecionismo virou estudo. E o estudo virou pesquisa profunda.
Uma das paixões de Leonardo é a série de 1749, feita exclusivamente para circulação no Maranhão. Ele possui moedas de mil e dois mil réis dessa série e, mais do que isso, estudou profundamente seu contexto histórico. A investigação revelou uma tentativa frustrada anterior, entre 1725 e 1727, de introduzir moedas de cobre na região — abortada por um naufrágio que levou ao fundo do mar cerca de 49 mil moedas de 20 réis.
“Dom João V recolheu as moedas restantes e usou a experiência como base para criar novas regras em 1749.”
Essas descobertas resultaram em artigos publicados nos boletins da SNB, demonstrando como a numismática revela eventos ocultos da história brasileira.
Leonardo também nos lembra de que moeda não é apenas metal. No Maranhão colonial, o pano de algodão era aceito como moeda — e, como as moedas, também foi falsificado. Essa forma de pagamento coexistiu com o numerário até que a Coroa Portuguesa decidiu intervir.
“O pano era o que menos se deteriorava, mas começou a ser falsificado. Isso exigiu novas políticas da Coroa.”
Boa parte das pesquisas de Leonardo envolvem documentos históricos, naufrágios, e cruzamento de fontes. Em uma dessas buscas, encontrou registro de um carregamento de sinos e moedas perdidos no mar — e identificou que parte dessas moedas, resgatadas, foram usadas localmente.
“A numismática é uma chave para se entender a economia, a política e o cotidiano da época.”
Além da história oficial, Leonardo resgata também o folclore popular: lendas de touros encantados guardando moedas, como no caso do sebastianismo nos Lençóis Maranhenses. A crendice local descreve com precisão moedas antigas — reforçando como o imaginário popular se mistura com a memória numismática.
Leonardo guarda suas moedas em cápsulas de proteção, usa alvéolos para peças secundárias e cataloga cada item com informações históricas. Não realiza limpezas — respeitando a pátina e os sinais do tempo.
“Limpar moeda é defraudar a história. Se a peça está com pátina, ela está protegida e deve ser mantida assim.”
Entre as raridades que mostrou, está uma 20 réis dos 400 anos do descobrimento do Brasil, encapsulada e preservada, além de um tetradracma de Atenas, com a famosa coruja — uma joia da numismática clássica.
Para Leonardo, a internet é uma ferramenta poderosa, mas perigosa:
“Ela traz conhecimento e desinformação. Cabe a nós filtrar, pesquisar e buscar fontes sérias.”
Ele defende o estudo constante, a contextualização das peças e a criação de conteúdo de qualidade. E deixa um conselho claro para novos colecionadores:
“Não se satisfaça com respostas prontas. Estude, investigue e descubra por si.”
Um dos momentos mais emocionantes da entrevista foi o reconhecimento do apoio familiar:
“Minha esposa é colaboradora, estuda comigo e hoje entende tanto que faz bons negócios também.”
Leonardo defende que os colecionadores devem envolver suas famílias no hobby, garantindo que as futuras gerações preservem e compreendam o valor dessas coleções.
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