A numismática, ciência que estuda moedas, medalhas e outros objetos relacionados ao dinheiro, tem se consolidado como campo de pesquisa acadêmica no Brasil. Nesta entrevista exclusiva para o NumisPlay, Oswaldo Rodrigues conversa com o professor Vagner Carvalheiro Porto, membro da comissão editorial da Revista Numismática Brasileira, sobre sua trajetória, experiências no ensino universitário e os desafios e oportunidades da pesquisa numismática no país.
Vagner Porto é professor do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (MAE-USP) desde 2013. Sua aproximação com a numismática ocorreu durante a graduação em História, quando optou por disciplinas de arqueologia. Foi orientado pela professora Maria Beatriz Borba Florenzano, referência nacional em numismática clássica, que o incentivou a ingressar nesse universo de pesquisa por meio dos “pequenos objetos encantadores” que são as moedas.
No mestrado, Vagner estudou numismática grega, com foco nas moedas da Sicília que retratam a divindade Hércules. No doutorado, mudou o foco para o Império Romano, analisando moedas da região da Palestina e da Judeia, sempre sob orientação da professora Florenzano. Desde então, nunca mais deixou de pesquisar e orientar trabalhos acadêmicos na área.
O professor destaca que estudar moedas vai muito além da economia. As moedas são fontes para pesquisas sobre política, religião, iconografia, sistemas ponderais e outros aspectos das sociedades antigas. Vagner relata que muitos alunos, inicialmente sem contato com o colecionismo, se surpreendem com o potencial multidisciplinar das moedas e acabam se apaixonando pelo tema.
Já formou mestres e doutores que desenvolveram pesquisas sobre moedas, abordando temas como triunfos romanos e a representação do imperador Augusto. O campo de estudo é vasto e permite múltiplas abordagens, mesmo dentro de um único período histórico.
Vagner Porto atuou como curador de importantes coleções numismáticas, como a do Itaú Cultural, a da Universidade de Santo Amaro e, atualmente, a da Unesp. Trabalhou na curadoria da exposição “Moedas do Itaú Cultural”, integrando moedas a obras de arte da Brasiliana. Destaca o crescente interesse pelas moedas brasileiras e a importância de orientar pesquisas sobre acervos nacionais, como a coleção do Museu do Ipiranga.
O acesso às coleções é um fator decisivo para o desenvolvimento de pesquisas. A escolha do objeto de estudo depende da disponibilidade de acervos, da problemática proposta e das hipóteses a serem desenvolvidas.
Curiosamente, Vagner Porto começou a colecionar moedas apenas após se tornar professor. Recebe moedas de alunos e colegas que viajam ao exterior e sua coleção é composta principalmente por moedas do mundo, incluindo originais e réplicas. Valoriza o aspecto educativo e afetivo das peças recebidas.
Vagner explica que a publicação de pesquisas acadêmicas em numismática segue o rigor científico das demais áreas: artigos passam por pareceristas, revisões e podem levar meses para serem publicados. O trabalho de divulgação é fundamental, e a Revista Numismática Brasileira está aberta a receber artigos científicos sobre moedas, contribuindo para a difusão do conhecimento especializado.
O professor relata experiências na curadoria de exposições, tanto em instituições públicas quanto privadas. Para viabilizar exposições de coleções particulares, recomenda parcerias com instituições culturais e o aproveitamento de editais públicos de incentivo à cultura. Destaca a importância de expositores adequados e do uso de tecnologia, como técnicas avançadas de fotografia (fotogrametria e RPI), para revelar detalhes de moedas desgastadas ou corroídas, facilitando a leitura de legendas e a classificação.
Vagner Porto enfatiza que técnicas modernas de fotografia e iluminação são acessíveis e úteis tanto para pesquisa quanto para exposições. Permitem visualizar detalhes invisíveis a olho nu, especialmente em moedas arqueológicas ou muito desgastadas, ampliando o potencial de estudo e catalogação.
A trajetória de Vagner Carvalheiro Porto demonstra como a numismática pode ser integrada ao ensino, à pesquisa científica e à divulgação cultural. Seu trabalho inspira novos pesquisadores e colecionadores a enxergar as moedas como fontes históricas riquíssimas, capazes de conectar diferentes áreas do conhecimento e contribuir para a preservação da memória material das sociedades.
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