Entrevistador: Oswaldo Rodrigues
Entrevistado: Felipe Botelho
Publicação: NumisPlay - Sociedade Numismática Brasileira
Na série de entrevistas da Sociedade Numismática Brasileira, Oswaldo Rodrigues conversa com Felipe Botelho, um colecionador apaixonado pela história brasileira e pelas moedas que a representam. Residindo atualmente em Hamburgo, na Alemanha, Felipe mostra que, mesmo à distância, é possível cultivar uma coleção com foco, qualidade e profundidade — especialmente quando aliada ao estudo constante e à sensibilidade histórica.
A trajetória de Felipe na numismática começa de forma marcante: ainda na adolescência, durante uma viagem familiar a Minas Gerais, encontrou no chão de uma praça um 10 réis da República Velha. O impacto daquele objeto centenário foi imediato. Complementado por incentivos do tio e a aquisição do primeiro catálogo, datado de 1997, Felipe iniciou uma relação de longa duração com as moedas e a história do Brasil.
Apesar de já ter adquirido moedas internacionais em bancas de jornal e feiras, Felipe logo percebeu que seu verdadeiro interesse estava na numismática brasileira. Sua coleção cobre desde a cunhagem colonial portuguesa na Bahia (1695) até o período republicano.
Além disso, nutre uma paixão recente pelas moedas do Império Romano, motivada por uma peça associada ao imperador Filipe I. A partir de então, formou uma pequena mas significativa coleção de moedas romanas de cobre e prata, com destaque para imperadores como Trajano, Constantino e Adriano.
Felipe defende um princípio cada vez mais adotado entre colecionadores experientes: menos moedas, com mais qualidade. Segundo ele, gerenciar uma coleção extensa pode ser custoso em termos de tempo, espaço e documentação. Prefere manter suas peças em álbuns compactos, priorizando estados de conservação superiores e raridades com valor histórico.
Entre suas peças favoritas estão:
75 réis de 1722, cunhado sobre 1 real de 1 kg — um achado raro e único conhecido com essa base.
20 réis flor de cunho, peça comum, mas extremamente rara em altíssimo estado de conservação.
Uma moeda descrita em catálogo de 1905 por Ismaily, que Felipe reencontrou 116 anos depois na mesma cidade onde mora hoje.
Esses exemplos mostram não apenas a sorte, mas a competência investigativa e o cuidado com a origem das peças.
Felipe acredita que o estudo é indispensável ao colecionador. Possui uma biblioteca sólida com catálogos brasileiros e estrangeiros — de Sirlei, Sluyter, Mauro Mattos, Roberto Gomes, entre outros — e destaca o catálogo de moedas romanas de David Sear como um de seus preferidos.
Também acompanha conteúdos digitais, como vídeos da PCGS no YouTube, entrevistas internacionais e publicações técnicas. Para ele, “uma moeda sem informação é apenas um pedaço de metal”.
Uma das maiores alegrias de Felipe na numismática é a conexão com outros colecionadores. Ele relata como formou uma amizade próxima com outro brasileiro residente na Europa por meio de uma negociação de moedas — relação que hoje inclui trocas constantes, dicas, livros e suporte mútuo. “A numismática nos aproxima. É mais que um hobby; é uma rede de amizades e confiança.”
Além das moedas, Felipe também mantém coleções de cédulas brasileiras, organizadas por assinatura e período. Gosta de peças carimbadas, como as da Cabanagem, Ceará, Maranhão e 960 réis modificados, por ver nelas registros da história monetária e dos processos de transição do país.
Felipe sugere que os novos colecionadores comecem por períodos recentes, como as moedas do real ou cruzeiro, ganhando familiaridade com estados de conservação, história e classificação. A partir daí, é possível aprofundar-se em séries mais antigas com segurança e propósito. Também recomenda: “foque no que te dá prazer e nunca deixe de estudar”.
Para Felipe, uma moeda não vale apenas por sua raridade ou beleza, mas pela narrativa que carrega. Ele destaca, por exemplo, a emoção de segurar uma moeda cunhada no ano da Inconfidência Mineira e imaginar quem a utilizou. “A numismática é uma viagem no tempo. Cada moeda é um pedaço da história que se pode tocar.”
Felipe Botelho representa a nova geração de numismatas comprometidos com o estudo, a ética e a preservação do patrimônio. Suas contribuições, mesmo a partir do exterior, enriquecem o cenário nacional. A entrevista é um convite a todos os colecionadores — novatos ou veteranos — a investirem tempo, atenção e sensibilidade em suas coleções.
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