A Sociedade Numismática Brasileira traz para o público mais uma entrevista da série "NumisPlay", desta vez com um dos nomes mais respeitados da numismática nacional: Cláudio Marcos Angelini. Com uma trajetória de mais de quatro décadas dedicadas ao colecionismo, estudo e promoção da numismática, Angelini compartilha sua rica experiência, desde os primeiros contatos com o universo das moedas até suas contribuições mais recentes para o desenvolvimento da área no Brasil.
Cláudio começou sua jornada aos 14 anos, em 1974, quando encontrou uma moeda argentina de 1882. Inicialmente, sua intenção era vender a peça para comprar carrinhos de autorama, mas ao perceber que ela não tinha grande valor comercial, acabou se encantando com outras moedas disponíveis no mesmo estabelecimento. "Comprei uma moeda inglesa com uma caravela, muito bonita, em cobre. Para mim, aquilo foi o início de uma jornada de conhecimento", relembra.
Um colega de escola, também colecionador, apresentou-o ao tio que tinha uma banca na Praça da República em São Paulo. "Entrei num mundo completamente diferente, com pessoas de todos os níveis, moedas de todos os lugares e todos os metais. Aquilo era o nosso parque de diversão", conta Angelini.
O envolvimento com a numismática se intensificou quando adquiriu seu primeiro catálogo, o "World Coins", que se tornou uma referência fundamental em seus estudos. "Eu ia dormir com ele embaixo do travesseiro, acordava com ele, ia para a escola com ele. Me apaixonei realmente pelas moedas antigas."
Em 1980, Angelini se associou à Sociedade Numismática Brasileira (SNB), onde permanece há 41 anos. Desde então, sua participação no universo numismático só cresceu:
Durante sua gestão na SNB, Angelini promoveu diversas iniciativas para difundir a numismática. Participou do primeiro Congresso Luso-Brasileiro de Numismática em Portugal, apresentando um trabalho sobre as moedas obsidionais holandesas no Brasil. Também esteve presente no segundo congresso, promovido pelo Banco Itaú em 2002, e no Congresso Internacional de Numismática em Madri.
Um dos projetos de maior orgulho foi a criação do Congresso Latino-Americano de Numismática, que realizou oito edições. "Tivemos condições de promover a numismática de uma forma totalmente nova, com palestras, exposições e trazendo grandes especialistas para palestrar aqui no Brasil", destaca.
Um trabalho particularmente significativo foi a promoção de aulas introdutórias de numismática para crianças de escolas públicas de São Paulo. "Promovemos um concurso de redação e essa aula abordando todos os aspectos da numismática para mais de 12 mil alunos. Um trabalho inédito que me orgulho muito de ter feito. Contratamos professores da Universidade de São Paulo que percorreram todas as escolas públicas", relata.
Angelini também atuou como curador de importantes exposições, entre elas uma realizada na Bolsa de Valores, outra em Salvador e uma terceira dedicada à relação entre música, matemática e dinheiro, no Rio de Janeiro. "As três exposições foram realmente um sucesso, não só pela qualidade das moedas, mas pela forma como foram apresentadas, com displays onde se podia ver as moedas frente e verso, além da distribuição de catálogos muito bem feitos."
Entre suas contribuições para a literatura especializada estão:
Atualmente, dedicando-se mais aos estudos durante a pandemia, Angelini tem se concentrado na semiótica numismática. "Acabei criando um novo livro que em breve será comercializado", antecipa.
Para Angelini, a numismática vai muito além do simples colecionismo de peças metálicas. "Isso me fez abrir o leque do colecionista, não só para moedas tradicionais", explica. Seu interesse pela semiótica o levou a estudar profundamente os simbolismos presentes nas moedas, especialmente nas gregas e romanas.
Como exemplo, ele explica o simbolismo da Vitória nas moedas antigas: "A Vitória era representada por uma bela jovem que voava com uma coroa de louros para homenagear os vencedores. Após uma batalha, ela recolhia todas as armas, capacetes, escudos e espadas dos vencidos, construía um troféu e o entregava aos vencedores. Isso é receber um troféu, e a vitória é aquilo que mais representa a satisfação."
Questionado sobre sua moeda mais icônica, Angelini menciona uma tetra-dracma de Atenas com a coruja e uma moeda de Septímio Severo com a Medusa. "A providência divina é o que faz a gente prosseguir. Para mim, essa é a moeda mais significativa, que tem mais valor sentimental", revela.
Para ele, a numismática não é um hobby para ganhar dinheiro, mas "um trabalho de vida para estudo do que nossos antepassados deixaram para nós." Cada moeda carrega significados que transcendem seu valor metálico ou financeiro.
Aos que desejam iniciar uma coleção, Angelini aconselha: "Não procure comprar quantidade e sim qualidade. Procure as moedas que têm mais valor cultural para você." Ele sugere que os novos colecionadores escolham um tema específico, como fauna e flora ou personagens históricos.
"Uma moeda na mão, você consegue escrever um livro", filosofa. "Se você pegar moedas gregas ou romanas, vai aprender muito. É uma cultura geral que está ao nosso alcance. Você não precisa ser rico para ter uma coleção de moedas."
Quanto à conservação, recomenda guardar as peças em envelopes de papel, evitando o plástico que pode danificar a superfície das moedas. "Você pode fazer suas anotações no papel: local de origem, valor, quanto pagou. Vai ter assim uma coleção maravilhosa com pouco dinheiro e que vai trazer muita cultura e muitas alegrias."
Com uma biblioteca pessoal de mais de 400 livros sobre numismática, Cláudio Marcos Angelini representa o espírito de dedicação e paixão que caracteriza os grandes colecionadores. Sua trajetória exemplifica como o interesse por moedas pode se transformar em uma rica fonte de aprendizado e em um veículo para preservação da história e da cultura.
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