Em uma entrevista fascinante conduzida por Osvaldo Rodrigue para a série da Sociedade Numismática Brasileira, a Professora Angela Gianeze Ribeiro, veterana do Museu Paulista (também conhecido como Museu do Ipiranga), compartilhou sua notável jornada no mundo da numismática. Com mais de 35 anos de dedicação à coleção numismática do museu, a história de Angela é marcada por paixão, catalogação meticulosa e uma profunda apreciação pelas narrativas históricas contidas em moedas e medalhas.
A introdução de Angela à numismática aconteceu em 1987, quando ingressou no Museu Paulista como estagiária enquanto cursava História na PUC. Inicialmente desconhecendo o termo “numismática”, ela se viu imersa nas diversas coleções do museu. Sob a orientação de Terezinha dos Santos, ex-membro da Sociedade Numismática Brasileira, Angela assumiu a responsabilidade de gerenciar a coleção numismática após a aposentadoria de Terezinha, iniciando seu compromisso de preservar e estudar esses artefatos históricos.
A coleção numismática do Museu Paulista, uma das mais antigas coleções públicas do Brasil, tem suas origens na coleção Sertório, adquirida pelo estado e doada ao museu no século XIX. Essa coleção, inicialmente parte de um museu público mais amplo, inclui moedas, medalhas e outros objetos que refletem a rica história do Brasil. Angela destacou que a própria Princesa Isabel teria admirado esse núcleo numismático inicial durante uma visita, evidenciando sua relevância histórica.
A maior parte da coleção é armazenada na reserva técnica do museu, com apenas cerca de 1% em exposição pública. O acesso físico à coleção é restrito, priorizando pesquisa e preservação. No entanto, desde a década de 1990, o museu trabalha na digitalização de seus acervos, inicialmente por meio de um software que exigia consulta presencial. Hoje, a coleção está acessível online através da plataforma Tainacan, que integra dados de várias instituições. Essa transição digital, junto com a plataforma Brasiliana Museus, ampliou significativamente o acesso aos tesouros numismáticos do museu, permitindo que pesquisadores e entusiastas de todo o mundo explorem moedas e medalhas catalogadas.
O papel principal de Angela envolve a catalogação, uma tarefa que ela considera extremamente gratificante. Recentemente, ela concluiu a catalogação de uma coleção de medalhas e condecorações doadas em 2013 pelo Embaixador Rubens Antônio Barbosa, que reuniu uma impressionante variedade de honrarias de todo o mundo. Para Angela, catalogar vai além de um processo técnico — é sobre desvendar as histórias por trás de cada peça, desde o local de cunhagem até seu contexto cultural e histórico. “Uma moeda não é apenas um pedaço de metal”, explicou. “É um objeto oficial com um propósito, um design e uma história, muitas vezes funcionando como propaganda em sociedades sem registros escritos.”
Além da catalogação, Angela supervisiona a conservação da coleção, distinguindo entre restauração (raramente realizada) e práticas de conservação, como limpezas superficiais para exposições ou publicações. Ela enfatizou a importância de preservar a pátina em moedas de prata, que atua como uma barreira natural contra corrosão adicional. Seu trabalho também inclui a curadoria de exposições, como a atual no Museu Paulista, que educa os visitantes sobre o trabalho do museu por meio dos temas de coletar, conservar, catalogar e comunicar. A exposição apresenta moedas e medalhas em ordem cronológica e por material, destacando suas diversas formas e composições.
Apesar de sua profunda envolvimento com a numismática, Angela não coleciona moedas, considerando as demandas de gerenciar uma coleção pública suficientemente gratificantes. Sua paixão pelo campo foi cultivada por meio da experiência prática, já que a numismática não é comumente ensinada nas universidades brasileiras. Sob a orientação da Professora Beatriz Florenzano, Angela realizou um mestrado estudando uma coleção particular de moedas no Museu Histórico Nacional. Mais tarde, colaborou com Florenzano e outros em um catálogo de moedas romanas em 2015, um projeto que considera um marco em sua carreira.
O conjunto de ferramentas de Angela inclui instrumentos de precisão, como balanças, paquímetros, lupas e equipamentos de ultravioleta para examinar características de segurança, destacando a natureza meticulosa do estudo numismático. Ela também depende de materiais de referência, desde os catálogos de Arnaldo Russo até os catálogos internacionais Krause, consultados tanto em formato impresso quanto digital. Embora as ferramentas digitais tenham agilizado a pesquisa, Angela ecoa o sentimento da Professora Florenzano de que nada se compara à experiência tátil de manusear uma moeda autêntica — de preferência com luvas para proteger sua integridade histórica.
A coleção numismática do Museu Paulista também desempenha um papel educativo. O setor educativo do museu utiliza moedas duplicadas em kits projetados para escolares, incentivando-os a interagir com objetos de maneira diferente das fontes escritas tradicionais. Essas experiências práticas despertam curiosidade e uma compreensão mais profunda das moedas como artefatos históricos, não apenas como moeda.
As contribuições de Angela se estendem a inúmeras publicações, incluindo artigos na Revista Numismática, editada pela Sociedade Ibero-Americana de Numismática em Madri, e contribuições para as revistas da Sociedade Numismática Brasileira. Seu trabalho ajudou a dar visibilidade à coleção do Museu Paulista, especialmente na era pré-digital, quando publicações em veículos como o Diário Oficial eram cruciais para a disseminação.
Enquanto Angela se prepara para apresentar seu trabalho no próximo Congresso Brasileiro de Numismática em dezembro, seu entusiasmo pela numismática permanece inabalável. Mesmo como aposentada, ela continua seu trabalho no museu, movida pela alegria de descobrir as histórias contidas em cada moeda e medalha. Para numismatas e entusiastas da história, a história de Angela é um testemunho do fascínio duradouro das moedas como janelas para o passado, e a coleção do Museu Paulista permanece como um recurso vital para explorar o patrimônio numismático do Brasil.
Comentário